quarta-feira, 18 de abril de 2012

Fotografar flores

Antes de mais, um esclarecimento: este texto destina-se, apenas, a fornecer algumas indicações práticas aos noviços da fotografia como eu. Os fotógrafos mais experientes, que queiram dominar as técnicas a empregar neste tipo de fotografia, poderão optar pela aquisição de um e-book que recomendo: Flowers... The Way I See Them, de José Antunes.
Dito isto, a fotografia de flores pode ser feita de dois modos: close-up e macro. Uma vez que não tenho material que me permita fazer fotografias macro, que requerem lentes próprias - ou tubos de extensão para macro - e um flash anelar (além de um tripé, evidentemente, mas esse eu até tenho, e por sinal muito bom), este texto vai referir-se exclusivamente ao close-up, a que tenho dedicado uma boa parte do tempo que despendo com fotografia.

1. O equipamento

Para este tipo de fotografia é necessária uma câmara equipada com um sensor que tenha, no mínimo, a área do 4/3. Este requisito tem que ver com a profundidade de campo, que deve ser bastante reduzida para obter o efeito desejado e aumenta ou diminui na proporção inversa da área do sensor.
Quanto à lente, para obter os melhores resultados é necessária uma grande abertura, da ordem de f2.0 ou, se possível, menor. Lentes com aberturas máximas inferiores podem produzir bons efeitos, mas podem obrigar a um plano focal mais distante, o que aumenta a profundidade de campo e não garante os mesmos resultados. 
Com lentes de abertura da grandeza inicialmente indicada - fotografar flores a f1.4 é uma experiência incrível! - é possível dispensar o tripé, uma vez que as velocidades de disparo serão, em princípio, consideravelmente elevadas, congelando qualquer movimento do objecto que possa ser induzido, por ex. pelo vento. Quanto à distância focal da lente, esta deve ser da ordem dos 100mm (equivalente) ou superior, uma vez que a profundidade de campo será tanto mais reduzida quanto maior for a distância focal. A lente que mais uso para fotografar flores é uma 50mm/f1.4, que equivale a 100mm numa câmara full frame. Deve também ser usado um pára-sol, de maneira a que a luz oblíqua não provoque aberrações na imagem.
2. No terreno

Deve, antes do mais, procurar-se locais onde exista grande variedade de flores. Qualquer flor pode dar uma boa fotografia, mas importa escolher exemplares bonitos e, acima de tudo, que estejam em bom estado, sem pétalas murchas ou orlas acastanhadas. A flor a fotografar deve estar isolada das demais, caso contrário será impossível obter o efeito que se pretende. As condições ideais de luminosidade não são, ao contrário do que se poderia imaginar, céu aberto e sol intenso. Isto leva à sobre-exposição, obrigando a fechar a abertura - o que fará perder o objectivo principal destas fotografias ao aumentar a profundidade de campo - e ao surgimento de reflexos da luz na flor. As fotografias devem ser feitas à sombra ou debaixo de um céu nublado, o que, além de evitar a sobre-exposição, permite imagens mais contrastadas e cores mais saturadas - por paradoxal que isto pareça. Fotografias feitas depois de ter chovido podem resultar bem pela inclusão de gotas de água - especialmente em macro -, mas podem também redundar em imagens com um conteúdo demasiado banal.

3. A técnica

A imagem deve ser colhida a partir de uma perspectiva interessante, o que pode obrigar o fotógrafo a escolher posições que os transeuntes poderão julgar estranhas, mas vale a pena. Devem ser evitadas perspectivas do alto e planos frontais das flores, uma vez que estas perspectivas correm o risco de tornar as fotografias pouco interessantes por não terem qualquer subtileza. Deve também evitar-se que a flor preencha todo o enquadramento, sendo as melhores fotografias aquelas que mostram o plano de fundo. É importante que o caule seja incluído, pois este permite uma percepção de ligação da flor ao terreno, mesmo que este último não surja na imagem, e deve, se não se optar por formatos quadrados, observar-se a regra dos terços.
A fotografia deve ser feita a curta distância. Todas as lentes indicam qual a distância mínima a que se pode fotografar com elas, e as fotografias ideais de flores são aquelas cujo plano focal se situa mais próximo desse mínimo. Ressalvo, porém, que devem ser mantidas distâncias superiores à mínima quando se usam teleobjectivas com grandes distâncias focais; não apenas para que a flor caiba no enquadramento, mas porque, neste caso, poderá haver partes da flor que surgem desfocadas.
Quanto às configurações da câmara, estas dependem largamente do gosto e intenção do fotógrafo. Deve ser usada a medição matricial, uma vez que a pontual pode escurecer excessivamente o fundo (mas não há como experimentar, porque podem obter-se bons resultados), e o equilíbrio dos brancos pode ser o de luz solar ou de nublado: este último produzirá uma ligeira saturação das cores que pode resultar bem.
 4. Focagem

A focagem é tratada aqui, separada do capítulo da técnica, por ser absolutamente fundamental para fazer fotografias de flores. Referi que a profundidade de campo deve ser reduzida, e fi-lo com base na minha experiência. Uma boa fotografia de uma flor deve apresentar um fundo esbatido - conhecido por bokeh, que significa «desfocado» em japonês. O desfoque do plano de fundo serve uma intenção estética e artística, mas também outra mais comezinha - mas não menos importante -, que é a de isolar a flor do plano de fundo. Com efeito, se o fundo estiver em foco (o que acontecerá se for escolhida uma abertura demasiado estreita), o olhar será inevitavelmente atraído para ele, desviando a atenção da flor. Deve escolher-se criteriosamente o ponto de focagem, de maneira a que a flor surja com nitidez e o fundo desfocado; isto pode ser feito com a focagem automática, seleccionando o ponto de focagem, ou focando manualmente, o que, em muitas câmaras, tem a vantagem de permitir um ajuste fino da focagem graças à função de ampliação que é activada quando se foca manualmente.
Para obter este esbatimento do fundo, basta manter um plano focal aproximado, usar uma abertura próxima do máximo e focar a flor; não é nada de particularmente difícil, desde que se tenha o equipamento apropriado e a paciência necessária. A fotografia de flores que verso aqui é reflexiva e ponderada, e não intuitiva ou reactiva, não sendo possível obtê-la por impulso. Implica um estudo demorado para escolher a melhor perspectiva, a iluminação mais adequada e as configurações ideais da câmara.  
Quando existe luz oblíqua, é possível que surjam clarões ou halos de luz na imagem; estes halos podem ser redondos, quando se usa a abertura máxima, ou poligonais quando se usam aberturas inferiores. Os halos podem beneficiar ou arruinar a fotografia, dependendo das opções estéticas do fotógrafo.

5. Processamento

Estas fotografias devem ser feitas no formato raw. Com este, é possível tratar a imagem muito para além daquilo que os parâmetros da câmara permitem quando se fotografa em JPEG. O uso do Photoshop, neste caso particular, não me repugna: por ex., é possível, em lugar do fundo esbatido, usar um fundo branco ou negro, o que pode resultar numa imagem esplêndida - embora os fundos naturais, desde que as técnicas descritas sejam devidamente aplicadas, sejam mais realísticos. Usar ou não o Photoshop fica ao critério do fotógrafo.

2 comentários:

Jose Antunes disse...

Boas Manuel Macedo

Interessante exposição do tema, reveladora das dúvidas e descobertas de quem explora a área. Um agradecimento pela noa sobre a minha modesta contribuição, o eBook que escrevi há um par de anos e que ando a promter seguir de outro. De facto tenho muitas mais experiências, preparando-me agora para ensaiar novos passos com flores.

Uma nota para os leitores que acho interessante: faço muitas das minhas fotos de flores com uma objectiva de 400mm capaz de focar a 1.8 metros. Quando a flor tem dimensão para tal, é excelente. Dito isto, uso câmaras compactas (escrevi um artigo para a revista dos Parques de Gaia que mostrava exemplos e tenho também um artigo no PhotoTuts, para onde escrevo) e também com Micro 4/3.

Tudo o que possa usar para fotografar flores... uso. E os desafios são diferentes mas sempre divertidos. E uma actividade calma.

abc

Manuel Vilar de Macedo disse...

Completamente de acordo, José Antunes. O seu comentário termina, aliás, com uma asserção importante sobre algo de que me esqueci de mencionar: «É uma actividade calma». Direi mais - é uma actividade que me imerge na fotografia e me faz esquecer tudo o que está à minha volta.
Pensar que, quando me comecei a interessar por fotografia, desdenhava a de flores por haver tanta gente a fotografá-las... a minha descoberta deveu-se - não posso negá-lo - à aquisição da lente Olympus OM 50mm/f1.4. Foi com ela que descobri o bokeh. A isto soma-se o facto de viver a 500m de um jardim botânico - prova de que 2 + 2 ainda dá 4!
Abraço,
M.