terça-feira, 6 de março de 2012

Manual das aberrações fotográficas (4)


Outro problema intolerável, e praticamente impossível de corrigir sem transformar a fotografia numa imagem completamente diferente da que se intentou, é o surgimento de halos ou clarões na imagem. Estas aberrações da imagem são aquelas cuja proveniência e explicação são mais óbvias: a incapacidade da câmara e da lente de lidar com o excesso de luz (sendo que, neste aspecto, não difere muito dos nossos olhos).
Fotografar directamente uma fonte de luz intensa, como o sol, é algo que os fabricantes recomendam que se evite nos manuais de instruções. E compreende-se porquê: o excesso de luz pode danificar o sensor, tal como, no tempo do filme, podia queimar a película. Há outro perigo, quando se usam visores ópticos e se fotografa com a lente apontada directamente ao sol, que é o de causar lesões oculares, uma vez que o excesso de luz é desviado, através do pentaprisma, para o visor.
Mas não é quando se fotografa directamente uma fonte de luz intensa, como o sol, que estes halos surgem (o resultado de fotografar o sol directamente – se o sensor resistir – é uma imagem fortemente sobre-exposta): é quando a luz é captada obliquamente à lente. Nestes casos surge uma mancha de luz, que pode (fortuitamente) resultar bem, mas que na maior parte das imagens tem um efeito nocivo. É o caso da imagem acima: a mancha esbranquiçada acima da linha do horizonte não é mais que um enorme clarão. Embora possa parecer uma nuance natural do céu, não o é (acreditem: eu estava lá e vi!): é uma aberração óptica.
Outra manifestação do excesso de luz oblíqua consiste no aparecimento de manchas na imagem, que geralmente - mas nem sempre, como se pode ver na imagem ao lado - têm a forma do diafragma: um ou mais pentágonos, hexágonos ou octógonos, de acordo com o numero de lâminas da íris. Este é um efeito dos reflexos que se produzem dentro da lente quando a luz incide sobre a mesma. Todos nós já vimos filmes, séries e documentários em que se recorre a estas manchas por opção estética, mas na fotografia é muito raro que resultem em boas imagens. 
Ao contrário de outras aberrações a que já me referi, esta pode ser evitada através de um expediente muito simples: o uso de um para-sol. O para-sol não faz nada se se fotografar o sol de frente (o que, a menos que a sua luz seja pouco intensa, como no ocaso ou ao amanhecer, é vivamente desaconselhado), mas é extremamente eficaz quando a luz solar incide lateralmente. Resta referir que os para-sóis devem ser adequados ao tipo de lente que se usa: lembremo-nos que o ângulo de visão da lente é tanto maior quanto menor for a distância focal, pelo que o para-sol para uma grande-angular é mais aberto do que o de uma teleobjectiva, cujo ângulo de visão se pode reduzir a 2 – 4º. O uso de um para-sol demasiado aberto numa teleobjectiva é ineficaz, por permitir a passagem da luz oblíqua, e, inversamente, o uso de um para-sol de ângulo estreito numa grande-angular vai provocar o escurecimento dos cantos da imagem. E, à falta de um para-sol, pode sempre proteger-se a lente com a mão, evitando que a luz incida sobre a lente. 
A referência ao escurecimento dos cantos da imagem leva-nos a uma outra aberração: a vinhetagem. Esta consiste no escurecimento dos cantos da imagem, e é uma característica mais ou menos necessária das distâncias focais reduzidas. Digo «mais ou menos» porque algumas lentes, geralmente caras e de concepção sofisticada, conseguem evitar este fenómeno. Embora a vinhetagem seja uma aberração, há fortes possibilidades de trabalhar com ela para tornar a fotografia interessante, à maneira das fotografias feitas com lentes pinhole – mas, em muitos casos, o resultado é indesejável. Só há uma maneira de evitar a vinhetagem: deitar fora a lente que a produz e comprar uma melhor. Não posso ilustrar o fenómeno da vinhetagem com fotografias tiradas com material da Olympus, porque nenhuma das minhas lentes produz esta aberração, mas a minha antiga compacta, essa, fazia o que se pode ver na imagem acima.
Há ainda uma outra aberração, conhecida por moiré (na falta de uma boa tradução), que importa referir. Esta consiste no surgimento de distorções da imagem em padrões uniformes - e. g. as malhas de um tecido - e é resultado de uma sobreposição de padrões em ângulos diferentes. Como os próprios captores de luz do sensor formam um padrão, o moiré pode acontecer quando se fotografam texturas finas num ângulo oblíquo ao padrão formado pelas células do sensor. O sensor tem um filtro anti-moiré, também denominado anti-aliasing, mas o seu efeito pode desaparecer quando se baixa a resolução da imagem. Quanto mais alta for esta última, menor será a possibilidade de esta distorção surgir. Na imagem abaixo, que foi descarregada do Olympus Viewer para o ambiente de trabalho na resolução mais baixa, o moiré é bem visível - mas não na imagem original, que foi tirada na mais alta resolução.
 As aberrações tratadas ao longo destes quatro textos têm quase todas a característica de serem inevitáveis. O que pode ser feito para diminuir o impacto de algumas delas é muito pouco ou quase nada. Apenas os halos podem ser evitados com recurso a para-sóis, mas mesmo estes podem ser ineficazes, como por ex. quando se usam zooms com uma amplitude muito grande entre as distâncias focais mínima e máxima, por ser difícil usar um para-sol que seja eficaz em ambas. Contudo, aberrações como o ruído e a difracção podem ser minimizadas pelo recurso a técnicas fotográficas correctas, como procurei explicar ao longo dos textos; outras podem ser corrigidas na pós-produção, e uma delas - a vinhetagem -, sendo consequência de uma qualidade deficiente da lente, não têm solução. De fora deste texto ficam defeitos de fabrico (como os globos brancos que afectam as imagens obtidas com a compacta Fujifilm X10, que têm provocado muito choro e ranger de dentes entre os adquirentes dessa câmara), uma vez que não são aberrações características da fotografia, mas anomalias de fabrico de determinados componentes.

Sem comentários: